terça-feira, 6 de março de 2012

Cortejo Real






A luz cobre dos postes me ilumina

Baratas na calçada me louvam

Edifícios solenes me apontam o céu



Motores de ônibus me ovacionam

Letreiros me testificam



Meus passos fazem girar o mundo


Vida longa!

Vida longa ao Rei!

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Lamento


Eu lamento o Sol que se vai indo
Que se embranha e se perde
Nos vãos das silhuetas dos prédios da cidade

Eu lamento
Esse vento gelado, as botas das moças, as blusas, as pessoas dentro dos carros

Eu lamento

Eu lamento os peixes frios na vitrine,
De bocas abertas, engastados no gelo

Eu lamento os homens de uniforme que lavam as calçadas, os taxistas, os guardas

Eu lamento as bitucas desprezadas, os papéis de bala

Eu lamento essa fumaça que a gente traga
E expira

Traga
E expira

Traga
E expira

Eu lamento essa névoa cinza que a gente exala

Eu lamento essas mãos no bolso
Esses olhares de infinito

Eu lamento os vidros da loja
Os toldos da lanchonete
Eu lamento os olhos claros da balconista
Os postes na calçada

Eu lamento em silêncio
Como se eu mesmo fosse lamentável

Eu lamento
Como quem canta um salmo

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Silencie


Envolva-me
Como o ar
Que a tudo envolve
Bem como envolve a si mesmo
Posto que não é diferente de tudo

Possua-me
Como possui a vida a cada ser vivente

Bem como cada ser tabém a possui
Mesmo que cedo ou tarde esta os deixe
E parta, ou deixe de ser, não se sabe bem ao certo pra onde, nem como

Beije-me
Antes que vãs palavras saiam de nossas bocas
Bocas humanas não são absolutas em nada que dizem
Mas dizem

Beije-me
Mesmo que seja findo todo o beijo
E que após, e antes, dele sempre hajam palavras
Mesmo que todo beijo seja contaminado de palavra

Silencie
Mesmo que silêncio algum seja pleno
Mesmo que o ar nunca seja estático

Mesmo que o ser, enquanto vivente, nunca cesse
Mesmo que a alma nunca cale

Silencie

sábado, 6 de fevereiro de 2010

Lúbrico




Quem me dera se um beija flor eu fosse
Desse um beijo na cândida flor de ébano
Flor lânguida do bico de teu peito
E no vale do seio adormecesse


Quem dera se meu nome pronunciasse
A tua boca, convulsa, intercalando
Sílabas por entre gemido e beijo
Entre súplicas e compunção latente.


Tuas firmes mãos a agarrar meu cabelo,
Impenitente e dolente, teu corpo
Cálido em ânsia febril envergasse.


Em fértil seara sem espantalho
Eu, pássaro louco, vôo em desvairo.
Áh! Quem me dera se eu te possuísse.

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Parto


Que eu veja ainda o Sol
Que antes de partir
Ele ainda me queime
Que antes eu ainda, descalço
Pise na grama a protestar

Que eu ainda sente
Antes que tenha de andar
Que ainda chore e ria
Antes que tenha de rir e chorar

Que eu ainda tente

Que antes eu sinta ainda
A ânsia de te ver
De ter ou de ser
De vomitar
Sinta ainda a dor
De partir, o desejo
De nunca chegar

Foz



Passar
Fluir


Como a água da chuva na calha
As do ribeiro no vale
As correntes do mar


Fluir
Passar


Tudo é passagem, tudo é flúido, efêmero
Mudança, trâmite, manar, correr


Para a foz, para o mar


Oceano ...